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Foto do escritorStefany Tagliatella

O que Sobra: A Beleza e a Dor em 'O Cisne' de Wes Anderson

“Algumas pessoas, quando sofrem demais, e são levadas até o seu limite, simplesmente cedem, desmontam e desistem. Há outras no entanto, embora não sejam muitas, que, por algum motivo, sempre são irreprimíveis. Nós os vemos em tempos de guerra, e também em tempos de paz. Eles tem o espírito indomável e nada, nem dor, nem tortura, nem a ameaça de morte fará com que desistam.”

A cena final do curta “O Cisne” de Wes Anderson, é o que se fixa, fluido e fortuito, como o voo de uma ave. A conclusão é uma partida distante. A sensação que temos é a de segurar uma areia fina com as mãos e seus grãos partirem por entre os dedos. É bom, mas o que sobra? 


(O que aconteceu com você?)


Para mim em particular, um sentimento de inquietação, uma certa dureza no ato de não tomar uma atitude. Diante a essa imposição de surdo e mudo que o filme impõe, a inquietação interna é o que resta na memória, mais do que o impacto da própria história. As imagens se fixam, e em um enredo completamente perturbador, a escolha por não representar visualmente os fatos, faz com que o fim, com o homem de All Star azul, roupas em tons sóbrios e asas de cisne presas às costas, caído no chão, ao lado da sua versão criança, fique em foco na mente, sendo essa a imagem mais perturbadora que essa história terrível carrega. Aqui a narrativa brechtiana presente nos filmes de Wes Anderson toma o seu espaço ideal (diferentes de outras obras do diretor). O distanciamento evidencia o horror, quase como uma forma de contar a visão de alguém que carrega um trauma, o relato é distante, forte e preciso, sem emoções ou sentimentos na entrega do que ouvimos, o que nos sobra é sentir pelo protagonista que não representa a dor, apenas relata.

O final, com a figura caída, abre espaço para uma interpretação dúbia, entre o desejo do que poderia ter sido e a consequência real. O grande ponto, não é o que realmente ocorreu ao fim da história, mas como já dito, o que sobra dela. Por onde ela nos leva e o que nos faz carregar. Os pontos de fuga das imagens são sempre distantes, sempre ao centro, Nos levando a focar a atenção para o centro da imagem, tentando nos empurrar para o miolo, para o cerne, como se o entorno, apesar de complementar o que estamos testemunhando, não alteram o que está ali, no centro. 

O fato é que os detalhes apenas tornam cada passo que damos em direção ao fim agoniante, perturbador e solitário. Meus olhos se enchem de lágrimas, quando penso que em meio a cada acontecimento ficcional, não ouve um condão capaz de liberar o protagonista da tortura, e que seus agozes são também vitimas de um limite extrapolado - Quando todos os limites são passados, o que sobra de humanidade? De piedade? De sentimento? De vida? 

Wes Anderson conseguiu com essa história nos deixar muito, tanto que essa é uma história que sentimos com o coração, a pele, os ossos e as lágrimas. Os olhos, apenas são testemunhas do que falta, o que sobra fica com o resto de nós. O que fica é a beleza que a imagem entrega e o sentimento não acompanha, o que sobra, é dor.


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